quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Eles ainda estão na área

Mesmo na beira da extinção, alguns profissionais lutam por um espaço no mercado

“Com que roupa eu vou? Pro samba que você me convidou (...)”. Quem nunca ficou na dúvida no que vestir na hora de sair? Pois é, o trecho da música do Noel Rosa ilustra muito bem o dilema no qual as pessoas passam. Chega o fim de semana, e o desejo é descontrair, além da preferência de um visual diferente para estes dias. Mas montar o guarda-roupa indo a lojas ou pedir para fazer de acordo com o próprio gosto e tamanho? Se for a segunda opção, a tarefa fica para o alfaiate, profissional quase extinto, mas ainda procurado quando o assunto é conforto e qualidade.

Assim é o trabalho de Rodolfo Baptista Figueiredo, 79 anos, e de seu irmão Edson, 72 anos, nascidos em Rancharia, no interior de São Paulo, e que trabalham neste ramo no bairro da Vila Romana em São Paulo. Os dois começaram ainda novos, pois achavam a área fascinante, e de tanto pararem em frente a uma alfaiataria quando voltavam da escola, um dos alfaiates do local perguntou se queriam aprender, após este dia e de uma conversa com seus pais, os irmãos passaram a ser ajudantes.

Desde os primórdios, a começar pelo Egito, Grécia e Roma a profissão já existia, sendo considerada uma das mais antigas do mundo. Na década de 50 funcionavam muitas alfaiatarias, principalmente em São Carlos, conhecida como a “cidade dos alfaiates”. “O problema da falta de profissionais hoje é a lei. Antes se pegava um garoto novo, pois não existe escola que ensine a prática, e agora não pode”, explica Rodolfo. Hoje, para se achar este tipo de profissional é preciso procurar muito, pois muitos desistiram devido à idade avançada, e os que ainda trabalham, estão na faixa dos 60 anos sem alguém para dar continuidade na atividade.

Para o exercício da profissão não é necessária uma formação, basta apenas a prática. Além disso, uma boa visão, habilidade manual, interesse por moda, senso estético e atenção a detalhes é essencial. Também é preciso saber usar máquinas de costuras e de acabamento, conhecimento de desenho e informática para aqueles que optarem pela indústria, mas são qualificações adquiridas por opção através de cursos.

Foi também sentado ao lado de uma pessoa, que José Apariciu Alves, 70 anos, começou a trabalhar numa sapataria na mesma cidade. Na época tinha 12 anos, e seus pais o achavam “rueiro”, termo empregado porque nas horas vaga ficava na rua, então resolveram colocá-lo como ajudante de seu tio que era sapateiro. Veio para São Paulo em 1959 e em 1975 montou o seu negócio, totalizando 58 anos de profissão.

Essa é outra área na qual houve queda no número de profissionais. Um dos fatores é o aparecimento das grandes indústrias que investem na beleza do produto em grande produção, mas deixam a qualidade e durabilidade a desejar, além do custo e a forma de pagamento oferecido pelos comércios. Sapatos baratos e de baixa qualidade fazem o consumidor descartar o velho e comprar outro, por isso os sapateiros buscam se aperfeiçoar para acompanhar as mudanças, como novas técnicas e colas para os consertos. “Não há tanta produção no meu trabalho, e sim qualidade”, afirma José.

Sobreviver com a modernização

Muitas outras áreas entraram em extinção devido ao avanço tecnológico, que muitas vezes fazem surgir novos segmentos, como mostra o documentário "O fim do sem fim", dos diretores Lucas Bambozzi, Beto Magalhães e Cao Guimarães lançado em 2001. Além dos sapateiros e alfaiates, outro ramo, também antigo, diminui ao longo dos anos: o barbeiro.

O ofício já era habitual entre os homens na Grécia antiga, e estes profissionais chegaram a fazer até pequenas cirurgias no século XVII, por exemplo extração de dentes. Antes, o foco maior era o homem, e se utilizava apenas pente, tesoura e navalha, no qual houve mudanças. Com a tecnologia, as navalhas que antes eram afiadas, agora possuem giletes descartáveis, e as máquinas manuais para cortarem os cabelos, hoje são elétricas.

Este é o trabalho de Abílio Gonçalves, 80 anos, sendo 65 só de ofício, pois começou cedo, aos 9 anos no bairro do Ipiranga. É num ambiente simples, com móveis antigos, um rádio de válvulas que esquenta marmita e uma máquina registradora de 100 anos, que ele atende sua antiga clientela, os de passagem ou jovens que não acertam na hora de se barbearem.

Para ele o número de profissionais caiu por conta do surgimento de cabeleireiros que atendem tanto homens quanto mulheres. “A tendência é cair mesmo! Cabeleireiro dá mais dinheiro”, afirma Abílio que perdeu 2 funcionários por conta do novo segmento.

Seja qual for a área, a modernização é inevitável e cada vez mais a procura será de serviços rápidos, simples e de custo baixo, mas enquanto houver a busca, mesmo que de uma minoria, por roupas, sapatos e uma barba de qualidade, haverá sempre um bom profissional a disposição.


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